quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

Dia 23 | O discurso de Wentworth Miller


Eu não nasci nesse país. Eu não cresci acreditando ou fazer parte de nenhum religião em particular. Tenho uma mistura de raças e sou gay.

Enquanto eu crescia eu era um alvo. Falando da maneira correta, se posicionando da maneira correta, segurando suas mãos da maneira correta. Todos os dias era um teste e existiam centenas de maneiras de falhar. Centenas de maneiras de trair a si mesmo, de não viver conforme as regras do que era aceitável e do que eles diziam ser “normal”.

E quando você falha no teste, o que era garantido de acontecer, tem um preço a ser pago: emocional, psicológico, físico, entre outros. Como muitos de vocês, eu paguei o preço mais de uma vez em uma variedade de formas.

Como muitos de vocês aqui, eu cresci no que eu chamo “modo de sobrevivência”. Quando você está em modo de sobrevivência, seu foco é conseguir chegar até o final do dia inteiro. E quando você está nesse modo as 5, as 10, aos 15 anos, não há muitos espaço para palavras como “comunidade”; para palavras como “nós”. Há somente espaço para “eu”.

De fato, palavras como “nós” não somente eram estranhas para mim, mas também soavam como uma mentira. Porque se “nós” realmente existisse, se realmente tivesse alguém lá fora assistindo, escutando e se preocupando, então eu teria sigo resgatado a muito tempo atrás.

A primeira vez que eu tentei me matar foi aos 15 anos. Esperei até minha família saírem para o fim de semana e eu estava sozinho na casa e engoli uma frasco inteiro de pílulas.

Eu não me lembro o que aconteceu nos próximos dias mas tenho certeza quando chegou segunda-feira eu estava no ônibus para a escola, fingindo que eu estava bem.

E quando alguém me pergunta se eu estava “chorando por ajuda”, eu digo “não”, porque eu nunca contaria algo assim para ninguém, principalmente quando você é um adolescente. Uma pessoa que decidiu tomar ação, dificilmente procuram por ajuda, dificilmente “gritam” por socorro ou ajuda.

Muitas pessoas somente choram por ajuda se acreditam que existe ajuda ou quando não querem acabar com tudo e esperam que alguém veja o seu “pedido de ajuda”.

Aquele sentimento de ser singular, diferente e sozinho, carreguei até os meus 20 e no começo dos meus 30 anos. Quando eu tinha 33 anos, comecei a trabalhar em um programa de televisão conhecido como Prison Breack que não teve sucesso apenas aqui nos Estados Unidos, mas também mundo a fora. O que significa que durante os próximos 4 anos, eu viajava para Ásia, Europa entre vários outros lugares. E no processo, dei centenas de entrevistas.

Eu tive muitas oportunidade de falar a minha verdade, que eu era gay mas eu escolhi não fazer. Eu era privadamente para alguns de meus familiares e amigos, que foram as pessoas que eu aprendi a confiar com o passar do tempo, mas profissionalmente, publicamente, eu não era.

Peça-me para escolher entre perder integridade e sair do armário, eu escolho mentir. Escolho perder integridade. Escolho enganar.

Porque quando pensava na possibilidade de falar minha verdade e penso em como poderia causar um grande impacto em minha carreira, que trabalhei tanto até agora, eu estava nutrido com medo, raiva e uma teimosia resistente que cultivei durante o passar dos anos.

Quando eu penso naquele garoto, em algum lugar que poderia ser inspirado ou movido por alguém como eu falando a minha verdade, minha menta resposta consistentemente era: “não, muito obrigado”.

Eu pensava que passei décadas construindo minha carreira, sozinho, sem ninguém, e de um certo ponto de vista, isso era tudo que eu tinha de bom em minha vida. Não podia arriscar perder o que construiu durante décadas porque pra mim, seria o mesmo que morrer. Minha carreira era só o que eu tinha. Minha carreira era o que me fazia continuar em frente. Se eu perdesse, o que me faria continuar vivendo?

Mas agora, tenho que colocar tudo isso em risco, para ser um modelo para alguém que eu nunca conheci e que talvez nem sequer exista. Pra mim, passar esse tipo de risco não fazia nenhum sentido. Nem mesmo levava em consideração naquela época.
Algumas semanas atrás, quando eu estava escrevendo minha carta para Saint-Petersburg festival internacional de filmes, rejeitando o convite, uma voz em minha mente dizia que ninguém iria notar. Que ninguém estava assistindo ou escutando ou se importando.

Mas desta vez, finalmente, eu sabia por experiência que essa voz estava errada. Eu pensei que se uma única pessoa notasse, está carta, onde eu falava minha verdade, e que integro minha história em uma escala muito maior e mais importante, então valeria apena enviar a carta.

Eu disse para mim mesmo “deixe-me ser para outra pessoa o que ninguém foi pra mim”.

Deixe-me mandar a mensagem para a criança, talvez na América, ou em qualquer lugar, uma criança que está sendo um alvo na escola ou em casa ou nas ruas, que essa pessoa saiba que tem alguém olhando, escutando e se importando, por mais que ela acredite que ninguém a vê, ninguém se importa e ninguém escuta. Que essa pessoa saiba que não está sozinha por mais que ela se sinta isolada e sozinha.

Eu quero que essa pessoa saiba que existe sim um “nós”, e aquela criança, ou adolescente, ou jovem ou adulto, é amado e não está sozinho.

Observações finais

Esse foi um discurso incrível de Wentworth Miller. Um dos maiores problemas para a vida humana é justamente o inimigo chamado sistema. 60-90% dos casos é possível ajudar essas pessoas antes que elas façam algo terrível. Porém, o sistema atual não permite que a ajuda certa chegue até essas pessoas. Por exemplo, a inteligência emocional não é desenvolvida corretamente nas escolas e na grande maioria dos casos, é ignorada completamente.

Como podemos mudar o mundo quando o sistema é contra nós?

O ser humano para amenizar o problema, utiliza vídeos e textos de motivação, discursos de pessoas famosas e importantes, criação de ajuda gratuita online, por ligação ou até mesmo usando a religião como uma forma de lidar com o problema, entre vários outros.

O que o ser humano faz é tentar compensar a crueldade do sistema, diminuindo a quantidade de dor e sofrimento causados pelo sistema.

A questão que quero deixar pra você é como podemos mudar o sistema para um sistema que não destrua as pessoas?

Como podemos crescer como seres humanos e subir para o próximo nível da humanidade se estamos tão apegados a um sistema que prejudica e destrói a vida de milhões de pessoas?

O que podemos fazer para melhorar a vida das pessoas para que consigam tirar o melhor proveito de sua existência aqui na terra?



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