Posted by Gabriel Orcioli on fevereiro 03, 2019 in Meditações Diárias | No comments
Parece paradoxal que, no início deste milênio, durante o que
chamamos com orgulho de “era da ciência”, tantos ainda acreditem em profecias
de fim de mundo. Quem não se lembra do bug do milênio ou da enxurrada de
absurdos ditos todos os dias sobre a previsão
maia de fim de mundo no ano 2012?
Existe um cinismo cada vez maior com relação à ciência, um
senso de que fomos traídos, de que promessas não foram cumpridas. Afinal,
lutamos para curar doenças apenas para descobrir outras novas. Criamos
tecnologias que pretendem simplificar nossas vidas, mas passamos cada vez mais
tempo no trabalho. Pior ainda: tem sempre tanta coisa nova e tentadora no
mercado que fica impossível acompanhar o passo da tecnologia.
Os mais jovens se comunicam de modo quase que incompreensível
aos mais velhos, com Facebook, Twitter e textos em celulares. Podemos ir à Lua,
mas a maior parte da população continua mal nutrida.
Consumimos o planeta com um apetite insaciável, criando uma
devastação ecológica sem precedentes. Isso tudo graças à ciência? Ao menos, é
assim que pensam os descontentes, mas não é nada disso.
Primeiro, a ciência não promete a redenção humana. Ela
simplesmente se ocupa de compreender como funciona a natureza, ela é um corpo
de conhecimento sobre o Universo e seus habitantes, vivos ou não, acumulado
através de um processo constante de refinamento e testes conhecido como método
científico.
A prática da ciência provê um modo de interagir com o mundo,
expondo a essência criativa da natureza. Disso, aprendemos que a natureza é
transformação, que a vida e a morte são parte de uma cadeia de criação e
destruição perpetuada por todo o cosmo, dos átomos às estrelas e à vida. Nossa
existência é parte desta transformação constante da matéria, onde todo elo é
igualmente importante, do que é criado ao que é destruído.
A ciência pode não oferecer a salvação eterna, mas oferece a
possibilidade de vivermos livres do medo irracional do desconhecido. Ao dar ao
indivíduo a autonomia de pensar por si mesmo, ela oferece a liberdade da
escolha informada. Ao transformar mistério em desafio, a ciência adiciona uma
nova dimensão à vida, abrindo a porta para um novo tipo de espiritualidade,
livre do dogmatismo das religiões organizadas.
A ciência não diz o que devemos fazer com o conhecimento que
acumulamos. Essa decisão é nossa, em geral tomada pelos políticos que elegemos,
ao menos numa sociedade democrática. A culpa dos usos mais nefastos da ciência
deve ser dividida por toda a sociedade. Inclusive, mas não exclusivamente,
pelos cientistas. Afinal, devemos culpar o inventor da pólvora pelas mortes por
tiros e explosivos ao longo da história? Ou o inventor do microscópio pelas
armas biológicas?
A ciência não contrariou nossas expectativas. Imagine um
mundo sem antibióticos, TVs, aviões, carros. As pessoas vivendo no mato, sem os
confortos tecnológicos modernos, caçando para comer. Quantos optariam por isso?
A culpa do que fazemos com o planeta é nossa, não da ciência.
Logo se a culpa é nossa, o que podemos fazer para corrigir o mal que causamos
ao planeta e as pessoas? Como corrigir o mal que causamos a nós mesmos?
A diferença está em nossas mãos. Você pode fazer a diferença de muitas
maneiras como melhorando sua vida, apoiando aqueles que querem
fazer do mundo um lugar melhor e principalmente mudar o sistema.
A ciência não tem culpa de muitos seres humanos tomarem
decisões horríveis e a ciência não pode mudar o fato das pessoas fazerem coisas
horríveis. Cabe a nós transformarmos o mundo em um lugar melhor porém como o
mundo pode ser um lugar melhor enquanto nossos inimigos sobem ao poder
destruindo países? Como podemos encontrar a paz se a paz somente pode ser
encontrada com o fim de tudo aquilo que destrói a humanidade e paradoxalmente o
ser humano?
A verdade é que, por enquanto e por causa do sistema atual, a
paz ou o bem para todos é apenas uma ilusão que faz parte dos sonhos daqueles
que vivem ilusões. Enquanto o sistema continuar o que é pode esquecer uma boa
vida para todos.
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